Se por acaso um dia esse tecido invisível que me cobre por inteira e desde sempre me sufoca se desgrudar de meu corpo, o arrancarei com tanta força, e o rasgarei todo, todo, para que não possa nunca mais vestir nenhuma frágil existência que não tem a força interior necessária para se desprender dessa casca ilusória que impede qualquer movimento senão interior e prende a nossa essência dentro da gente, de modo que ninguém possa compartilhar do que há de bonito em nossa alma (e de feio também). Livrando-me desse empecilho, suspirarei com tanto prazer ao sentir minha face livre tocar o ar, que ele poderia se machucar com tamanha força de expiração. Será uma dor boa perder o que sempre me guiou (contra todas minhas vontades), acho que gritarei por surgir dentro de mim uma sensação repentina de coragem que num movimento impulsor grita para mostrar poder; ou gritarei devido à uma felicidade incontrolável, dessas que querem rasgar o peito e pular pro mundo; ou até de susto por ser uma sensação desconhecida que brotou inesperadamente; tanto faz porque no fim o grito é o mesmo. Gritante e despida, jogarei os retalhos pútridos da vestimenta contra o vento, que com a minha recomendação, os levará para qualquer dimensão inalcançável para que nunca qualquer anjo mau os costure e tente me vestir à força novamente. Juntarei os pedaços de cada história interrompida por esse manto que cobria meus olhos, sufocava minha fala, impedia minha respiração, e consertarei meticulosamente a vida que perdi. Correrei contra os fatos, voltarei no tempo, mudarei o sentido da terra. Para sempre nua dos meus medos.
(Escrevi esse texto há dois anos, mas ele significa tanto pra mim que faço questão de postar nesse blog).
Putz,eu não poderia ter me identificado mais.
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